Mesmo durante épocas bem definidas, como a época das águas, podem existir diferentes tipos de pastagem e isso acontece porque alterações mínimas nos fatores ambientais já impactam os valores nutricionais das plantas e afetam de maneira significativa o desempenho animal. Por isso se faz necessário um manejo nutricional específico para cada fase, não somente na seca e águas, mas também nas fases transicionais.
Fazendo uma analogia a nós, seres humanos, quando iniciamos uma dieta para perda de peso, saímos de uma dieta rica em calorias e optamos por uma alimentação com menor densidade energética. A perda de peso normalmente não é imediata, mas com o passar dos meses a mudança causa efeitos significativos. Quando trazemos esse cenário para os bovinos, ao saírem da fartura do pasto verde para um que está em queda de qualidade, esses animais começam a perder peso de maneira sutil, associado ao maior teor de fibra do pasto que causará uma diminuição da taxa de passagem, isto é, o alimento ficará mais tempo dentro do rúmen para ser digerido e a ingestão de capim pelo animal será menor, causando um déficit calórico maior ainda.
Pelo fato dessa queda de peso ser gradativa, muitos pecuaristas não enxergam de imediato o impacto que a perda de peso nestes três ou quatro meses de transição podem causar, e o quanto poderá representar em um alto investimento em nutrição para compensar a falta de planejamento.
A perda de peso acontece pela diminuição da microbiota ruminal. Todo alimento, quando consumidos pelos ruminantes, é transformado por bactérias, protozoários e fungos presentes no rúmen. Os processos de digestão e fermentação executados pelos microrganismos ruminais fornecem os ácidos graxos voláteis, que são utilizados como fonte de energia, e a massa microbiana representa a principal fonte de proteína para o hospedeiro. Da mesma forma que os ruminantes dependem da microbiota ruminal para sua sobrevivência, esses microrganismos dependem de fontes proteicas, energéticas e minerais, ingeridas através das pastagens e suplementação, para que haja síntese microbiana.
Através da manipulação da relação proteína:energia é possível alterar os processos fermentativos e maximizar a eficiência de síntese microbiana, bem como a eficiência de utilização dos nutrientes da dieta.
Segundo a lei de Liebig, também conhecida como lei dos mínimos, o desempenho do animal será limitado pelo elemento em menor quantidade na dieta, ou seja, de nada adianta fornecermos energia em níveis adequados, se os níveis de proteínas ou minerais não estiverem adequados na dieta.
Como citado anteriormente, durante a fase de transição ocorre queda nos níveis nutricionais das pastagens, principalmente no diz respeito a proteína. Em pastos de Brachiaria por exemplo, que são as pastagens em maior abundância no Brasil, podemos ter uma queda de 50% do teor de proteína por quilo de matéria seca, do período das águas para secas, enquanto a energia vai variar em torno de 20%. Mas atenção, isso não quer dizer que não precisamos suplementar energia, a dieta deve ser balanceada de acordo com a exigência do animal, objetivo da propriedade e sempre visando a máxima eficiência ruminal, dando o aporte necessário para a multiplicação de bactérias, protozoários e fungos do rúmen.
Não existe uma técnica específica para todos os sistemas de produção, em todas as regiões. De maneira geral, quando falamos de transição águas-seca, temos que nos atentar ao planejamento alimentar da propriedade, para definir uma maneira de compensar a queda da produção de forragem. Um bom planejamento estratégico deve ser feito com pelo menos um ano de antecedência, ou seja, o criador deve ter traçada a sua meta para o ano e, dessa forma, tomar as decisões de acordo com o objetivo de sua propriedade. Nem sempre podemos traçar o caminho, mas é importante que se tenha um objetivo, a partir daí, quem se planeja se destaca.
O produtor deve ter em mente que o custo para fazer com que o animal recupere o peso perdido durante a transição e/ou seca, é muito maior que o investimento para fazer com que o animal mantenha seu escore corporal ou até ganhe peso nessa fase.
Infelizmente os prejuízos da má nutrição durante a fase de transição, não se restringem ao baixo escore corporal dos animais e o custo com sua recuperação. A desmama, que na maioria das vezes é realizada durante o período de transição, é um período de estresse intenso ao bezerro e isso interfere diretamente na saúde imunológica e intestinal dos animais. Mesmo com os melhores esforços os bezerros passarão pelo estresse e se quisermos ser bem-sucedidos na eficiência de produção de bezerros, precisamos aprimorar através da nutrição para dar suporte imunológico e melhorar o ambiente intestinal. Essa saúde apresentada na desmama refletirá na recria desses animais, auxiliando em características como idade a puberdade, produção de carne a acabamento de carcaça.
Além do preparo para desmama, o bezerro deve ser cuidado desde a sua gestação. As fêmeas prenhes determinam aos bezerros, através da programação fetal, como estes devem se comportar no ambiente extrauterino. Nos terços inicial, médio e final de gestação, diversas características dos bezerros são pré-definidas, como a miogênese, isto é, formação de células musculares, hipertrofia dessas células, a adipogênese, que se trata da formação de células de gordura, além de outros fatores como qualidade de células reprodutivas, que podem acompanhar os animais por até três gerações. Caso haja privação nutricional das fêmeas durante a gestação, parte dessas características, senão todas, serão prejudicados de forma irreversível para o animal gerado.
É fato que o pasto é o principal sistema de produção de carne e leite no Brasil, sendo a fonte mais barata de alimento para o rebanho. Algumas estratégias podem ser usadas para que os animais passem pela transição e cheguem à seca bem nutridos e com bom escore corporal. Uma estratégia simples, mas que exige planejamento, é a vedação de pastos no final do período chuvoso. Dessa forma o produtor consegue um acúmulo de massa para ser aproveitado no período mais seco que se aproxima. Aliado a isso, o descarte ou redistribuição dos animais, aliviando a taxa de lotação dos pastos, também se tornam alternativas viáveis a serem iniciadas nessa fase.
Todo esse manejo, deve ser sempre associado a uma suplementação correta, lembrando que, por mais que o animal tenha disponibilidade de forragem, durante a fase de transição das águas para a seca há uma queda no valor nutricional, aumento no teor de fibra e o animal precisa manter uma dieta balanceada para uma máxima eficiência ruminal e máxima ingestão do alimento disponível.
Todas essas tomadas de decisões visam diminuir o impacto da entrada da seca, para que não haja surpresas com a falta de alimento e para que o animal não tenha queda no desempenho na fase mais crítica do ano. Vale ressaltar que todas as decisões tomadas ainda na época de águas e transição, determinarão o sucesso no período seco e nas águas do próximo ano, e dessa forma o sucesso no desempenho dos animais a longo prazo.